16/03/2013

VALOR E SENTIDO DO CÓDIGO DE ÉTICA DO CFB


Está à disposição dos interessados o relatório da pesquisa:
Valor e sentido do Código de Ética do Conselho Federal de 
Biblioteconomia (CE-CFB) para o bibliotecário brasileiro 
atuante em biblioteca universitária. Trata-se de pesquisa realizada em 2012, por Francisco das Chagas de Souza, como parte do Estágio de Pós-Doutoramento cumprido na UNESP-Marília - Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, com a supervisão do Professor José Augusto Guimarães.
  

 http://eprints.rclis.org/18817/

13/03/2013

Consciência Profissional: vamos sair da zona de conforto?



(Palestra apresentada em Brasília - DF  por ocasião da Comemoração do Dia do Bibliotecário em 12/03/2013, promovida pela Biblioteca da Presidência da República, juntamente com Sistema CFB/CRB, ABDF, UNB, em evento intitulado “Consciência Profissional: vamos sair da zona de conforto?



Francisco das Chagas de Souza

Universidade Federal de Santa Catarina

Departamento e Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação


A vida pessoal e a vida profissional representam distintos âmbitos da existência do indivíduo na sociedade. Tomando-se essa noção como premissa, pode-se situar o tema desta discussão considerando alguns fundamentos que foram intuídos por distintos pensadores de diferentes épocas, situados em contextos particulares. Certamente, eles puderam refletir sobre circunstâncias que se lhes deram como vivências, tomadas das experiências mais imediatas que tais épocas e contextos puderam lhes dar à observação como universos de relações. A partir de suas buscas intelectuais, esses pensadores constituíram uma consciência de Ser, isto é, formaram um conhecimento sobre o homem, seu lugar no universo, a distinção da singularidade pela individuação, a interrelação Eu + Outros, as distintas ações que Eu + Outros podem desenvolver, o sentido dessas ações para Eu + Outros, a ideia da comunhão Eu + Outros como Nós, a ideia da confrontação Eu [contra] outros, etc. 
 

Estou falando aqui a partir de uma matriz de pensamento que leva em conta a existência de um mundo em que vivemos porque o construímos socialmente a partir da nossa constituição como indivíduos, que só pode se dar pela presença de outros indivíduos já à espera de nossa chegada ao mundo da vida, ao mundo da leitura, ao mundo econômico, ao mundo do trabalho. Essa matriz de pensamento constitui a corrente filosófica designada Fenomenologia cujo principal expoente no século XX foi Edmund Husserl. Como teoria social convergente com essa filosofia se constituiu o Construcionismo, isto é, uma forma de expressão, também chamada fenomenologia social, tendo como estudiosos mais destacados Alfred Schutz e Thomas Luckmann. A produção encetada por esses pensadores tem sido expandida por vários seguidores: Dreher, Acevedo, Carcamo Landero, Estrada Saavedra, Mora Nawrath, Salas Astrain, Hernandez Romero, Retamozo, dentre outros.


Tomo um pequeno recorte de um texto de Dreher, que analisando o pensamento de Schutz e Luckmann define o alcance do conceito de mundo da vida, apresentado como uma noção chave da reflexão daqueles autores:

“...el mundo de la vida incluye no sólo la esfera del yo solitario, sino especialmente al mundo social, y particularmente las ideas colectivas compartidas, tales como las realidades religiosas, científicas, artísticas o politicas com una estructura de sentido finita, pero también los mundos de los sueños y la fantasia” (DREHER, p. 87)



Nessa concepção esboçada, exposta e afirmada como “teoria do mundo da vida” tal mundo se manifesta como a realidade inteira, nos seus diferentes âmbitos, que se nos apresenta, a partir de nossa experiência individual, e independentemente de nosso estado de consciência e vigília. Tendo em vista que nos situamos perceptivamente nas dimensões externa e interna de espaço e tempo, temos como foco central a realidade cotidiana, na qual se constituem nossas razões para fazer algo e nossas motivações para alcançar resultados. Essa focalização na realidade cotidiana não nos isola das realidades extracotidianas (constituidoras do nosso acervo de conhecimento já constituído sobre o passado e projetado). Parte substantiva da realidade cotidiana é constituída pelo que os autores da fenomenologia social chamam de mundo do trabalho. Esse conjunto de relações, situações e circunstâncias não se faz sem os meios necessários à sua realização e que são possíveis a partir da ação social e da comunicação.


Um aspecto não negligenciável dessa fundamentação teórica, é que ela tem obtido uma relevante atenção dos pensadores de distintos campos acadêmicos e profissionais durante grande parte do século XX atravessando-o e alcançando o século atual. Com outra forma de expressão essa fudamentação está presente na produção reflexiva de Habermas, Moscovici e outros filósofos, psicólogos e sociólogos que voltam seus olhares para o conhecimento e as determinantes epistemológicas dos vários ramos de ciência, com maior ênfase nas ciências humanas e sociais. Por essa razão, pode-se dizer que essa fundamentação contribui como uma base para que se possa refletir sobre um tema tão amplo quanto Consciência Profissional e atitude Profissional, que é a maneira pela qual traduzo o título desta programação alusiva ao dia do bibliotecário em Brasília. 
 

Quando o indivíduo, pelo seu envolvimento com ações e conteúdos relativos ao mundo do trabalho, forma uma consciência profissional dele se espera o domínio de claras evidências de onde vem e em que consiste o seu campo profissional (ou seja, qual é a ontologia desse campo?); quais são as finalidades a serem atendidas com as ações desenvolvidas a partir dessa ontologia (isto é, qual sua teleologia?); quais são os compromissos humanos e sociais que estão sendo atendidos com as ações realizadas (isto é, quais princípios doutrinários da ética estão em jogo?) e, por fim, qual o teor que constitui o seu saber profissional, as formas de constituição desse saber, as implicações da escolha feita em relação aos meios e procedimentos para constituir esse saber (ou seja, qual a sua epistemologia?). 
 

Atenho-me aos aspectos apontados no parágrafo que precede, tomando como horizonte disciplinas ou ramos da Filosofia, por acreditar que ficam evidentes ao menos dois momentos a serem considerados no exame do tema aqui discutido. 
 

O primeiro, consciência profissional, guarda maior relação com a compreensão que o profissional pode formar em torno das finalidades ou teleologia de sua ação, cuja realização depende do conhecimento que ele domina e que o caracteriza socialmente como especialista. O segundo, atitude profissional, está mais imediatamente relacionado com os compromissos humanos e sociais, isto é, com a ética a ser orientadora de sua ação profissional, ou seja, que lhe cobra afirmar como valor profissional os princípios que norteariam a relação de comunhão Eu + Outros como Nós e jamais a relação confrontativa Eu [contra] Outros. 
 

Esses focos se inserem como parte do mundo do trabalho, o qual pode ser tratado como um recorte da realidade cotidiana que, por sua vez, está articulada ao mundo da vida. A consciência profissional e as distintas manifestações de atitude profissional são, portanto, circunstâncias construídas a partir da realidade cotidiana, das realidades extracotidianas, do mundo escolar e, por isso, é consolidada como conhecimento que se institui ao ser conformado como um extrato, sempre em movimento, do mundo da vida. 
 

De outro lado, pode-se considerar que Consciência profissional e as várias expressões de Atitude profissional são também saberes ou a expressão de um domínio que se forma pela influência de relações interpessoais que ultrapassam o mundo escolar teórico e o mundo das aprendizagens práticas. Assim, a consciência profissional e a atitude profissional incorporam valores que vêm do universo das vivências familiares, das convicções religiosas, da aceitação das diferentes formas de expressão social e humana, da historicidade do campo profissional, etc. 
 

Isso quer dizer que Consciência e Atitudes profissionais são formas, a primeira abstrata e a segunda representacional, que expressam profundos valores. Evidentemente, que, por isso, elas são produtos de interpretações formadas a partir de ilimitadas sensações e situações que se dão no mundo da vida, como tudo o mais que compõe as deliberações individuais e as ações dos indivíduos nesse mundo. 
 

Do modo como aqui interpreto o tema proposto e a forma como penso que para ele os organizadores do evento foram levados, posso intuir que há uma valoração exposta em sua formulação. Creio que desejariam dizer que para demonstrar ser profissional consciente é preciso que o membro dessa categoria de trabalhadores especializados saia de uma assim denominada zona de conforto, lugar representacional que significaria a assunção de uma atitude moralmente negativa e até antissocial de quem nela se encontra. 
 

Neste ponto, para problematizar a ideia zona de conforto, que é decorrente de uma atitude pessoal de quem nela se encontraria, caberia definir do que se trata tal zona no mundo do tempo presente. A resposta mais imediata que se pode obter assimila essa noção a uma predisposição do indivíduo, cada indivíduo que lá estaria, a centrar-se apenas em si mesmo, especialmente em relação a fazer investimentos de tempo e dinheiro no seu desenvolvimento e atualização profissional, a tomar iniciativas, a buscar uma permanente superação do conhecimento que domina. Pode significar que um conjunto de indivíduos, inseridos em dada profissão, envolvidos com a realização de suas ações profissionais numa determinada região geográfica e socioeconômica, não consegue ter uma convivência e uma leitura suficientes dos fatos do cotidiano e, assim, estariam fraudando sua missão na sociedade. Mas, nessa hipótese, quem está assumindo perceber e afirmar que ocorre essa fraude? São outros contra uns tantos eles; são os Nós que acreditam estar agindo da forma correta. Esse Nós, que significaria o conjunto dos que agem bem, em seu grupo próximo, estariam convictos que não mantém uma atitude de má convivência e má leitura de seus objetivos no sentido de serem atuantes, empreendedores e certamente atualizados, etc. E, assim, apontam aqueles Outros, protegendo o seu Eu interior (pessoal e grupal), sendo guardiães de sua identidade profissional, fonte saneadora de sua consciência. 
 

Neste ponto desta comunicação caberia lembrar que estou a apontar aspectos que se aproximam do teleológico (ou seja, das finalidades que um Eu enxerga acerca de sua atuação profissional) e do ético (isto é, do bem que esse Eu sente produzir com sua atuação). Esses Eus assumem uma direção de sua individualização e valorizam a oportunidade de apontar de certa forma para quem é tido por eles como acomodado, numa atitude de denunciar a Outros que lhes envergonham e lhes desvalorizam socialmente. 
 

Porém, pode-se perguntar se não é possível formar outro juízo, partindo de outros fatores de valoração? Por exemplo, tomando agora o aspecto epistemológico, isto é, de tentar compreender como se constrói o conhecimento do saber profissional do bibliotecário ocidental. De tentar considerar que pode vir daí a base de certa conduta profissional inapropriada.


Quero me reportar a uma reflexão que considero muito expressiva, de Alfaro Lopez, segundo a qual o bibliotecário também poderia estar condicionado em sua atuação profissional pela matriz originária de um conhecimento tomado como um saber próprio, fundamentado e suficiente. De acordo com o autor, que sustenta a maior parte de sua reflexão na obra de Bachelard, o conhecimento empírico da Biblioteconomia do século XIX, majoritariamente formado como a codificação da prática, por isso, de forte recorte técnico, pouco abstrato, isto é, limitadamente teórico, atingiu, desde há muitas décadas o estágio de obstáculo epistemológico, ou seja, avolumou-se em determinado patamar de saberes e não impediu que os profissionais se conformassem com tais limites desse conhecimento. O início da construção dessa estagnação foi em parte contemporâneo de uma orientação epistemológica positivista, quantitativa e autoconservadora, que ele demonstra. Dito de outra forma, a formação do conhecimento biblioteconômico passou a olvidar as transformações pelas quais passavam o mundo da vida e o cotidiano. Os criadores do conhecimento biblioteconômico majoritariamente continuaram a produzir um saber superado, incapaz de responder ao mundo da vida e com sérias implicações à limitação de seu mundo do trabalho. Os bibliotecários continuaram a aplicar esse mesmo saber, respaldando-se no argumento de sua origem acadêmica. 
 

Retorno à teoria do mundo da vida, e destaco da leitura de Mora Nawrath a afirmação sobre o mundo cotidiano que busca em Schutz. Ele diz que “Schutz supone que el mundo cotidiano es un campo de acción o dominación em el cual llevamos a cabo nuestro proyecto” (p. 55). Dito de outra maneira, os indivíduos não agem sem um objetivo, sem um projeto em mente. Se isso for tomado como verdadeiro para o profissional bibliotecário, pode-se perguntar se a produção e adoção de um saber teórico superado constitui parte do seu projeto de participação no mundo do trabalho. Se esse saber teórico superado, que é seu projeto, lhe impede de ver no seu cotidiano a necessidade da ação política como um dos motores da ação profissional. Sendo as respostas positivas para essas questões, tal projeto pode ser constitutivo de uma atitude a qual se deve chamar de zona de conforto?


Ao tratar de outra noção fundamental, dentre aquelas que construiu, isto é, o conceito de ação humana, Schutz (A formação de conceitos, p. 153) afirma: “... o conceito de ação humana em termos do pensamento do senso comum e das ciências sociais inclui o que pode ser chamado de ações negativas, isto é, abstenção intencional de agir...”. 
 

Em síntese, pode-se dizer que há uma epistemologia positivista que presidiu a construção a partir do século XIX de um conhecimento biblioteconômico contendo determinadas características, que o incapacita de responder adequadamente às demandas do mundo atual. Esse conhecimento, por ser ainda predominante constitui um obstáculo epistemológico, para usar os termos de Bachelard, que exigiria dos produtores de conhecimento biblioteconômico a promoção de uma ruptura epistemológica, estratégia que não está inteiramente evidente. A persistência da produção de um conhecimento biblioteconômico superado, é, ainda assim, adotada como caminho para formular o suporte teórico de uma ação profissional, a qual nos termos de Schutz pode ser caracterizada como uma ação negativa intencional de parte de um segmento significativo de bibliotecários brasileiros. Essa ação negativa causa perturbações no âmbito técnico, político e acadêmico do corpo profissional atuante no país. Ao ser percebida por alguns membros da categoria profissional bibliotecária essa ação negativa intencional leva-os a afirmar que Outros estão na zona de conforto e dela precisam sair, como expressão de boa consciência profissional. 
 

Ora, será que toda a complexidade das relações existentes no universo bibliotecário, incluindo a precariedade da visão se seus membros sobre boas práticas profissionais, cabe nesta noção de zona de conforto? Quero voltar um pouco, mas muito rapidamente ao quadro de desenvolvimento histórico da moderna profissão de bibliotecário no Brasil. Primeiro, fez-se a Escola profissionalista (ELSP - 1937); segundo, a entidade política (APB - 1938); terceiro, o fórum de discussão profissional (CBBD - 1954); quarto, a entidade de representação acadêmica das escolas e docentes (ABEBD - 1967); quinto, a entidade de organização da pós-graduação e pesquisa em Ciência da Informação (ANCIB - 1989), etc. Essa ação expansionista constante que começa no ambiente de ensino, que se desdobra na ação política, cria a continua discussão sobre a revisão de currículos de ensino de graduação; cria sucessivamente entidades de representação, cria uma entidade própria para pensar sustentadamente a pós-Graduação (ANCIB) expressa pela continua renovação e ampliação do número de GTs, para mim, em parte, não confirma que haja a zona de conforto como uma totalidade na qual habitam os bibliotecários brasileiros. Admito que houve e há no âmbito mais estrito da ação política uma zona de conflito, na medida em que um dos momentos importantes para dar fluxo ao mundo da vida, a comunicação, parece ser permanentemente bloqueado. 
 

Eu, juntamente com poucos colegas, temos feito um grande esforço em manter vivo o interesse na pesquisa das temáticas: educação, profissões da informação, ética profissional, mundo do trabalho, etc. cujos pesquisadores se reúnem no GT6-ANCIB e ali relatam suas sínteses. Por força desse esforço, percebemos a partir de 2007 que havia um grande problema a ser enfrentado: a fraqueza das entidades profissionais de bibliotecários, arquivistas e museólogos, decorrente de uma quase inexistente interlocução entre elas. Essa ausência de interlocução ou conexão as impede de aproximar discursos e defender causas de interesse comum em benefício da sociedade brasileira. Em 2009, surgiu o Fórum das Entidades da Biblioteconomia e Ciência da Informação no Brasil – Fórum EBCIB, como espaço parlamentar, livre, não formal, sem estrutura burocrática, a fim de promover a reunião das entidades para fins de conversação e encaminhamentos de ações. Para isso, se esperava que as entidades, ao terem que se expor entre si promovessem internamente uma dinâmica de renovação de laços e de debates entre seus membros. 
 

Tal expectativa, de minha parte, foi inspirada na Teoria do Mundo da Vida, pela compreensão de que a comunicação é de fato, como postula aquela Teoria, a condição inicial para o trabalho, para a vivência cotidiana e para a inserção na realidade, bem como para construir a transformação dessa mesma realidade. 
 

Em outubro de 2012, por ocasião da IV Reunião do Fórum EBCIB, no Rio de Janeiro, foi dito aos mais de 20 participantes presentes, entre representantes da Arquivologia, Biblioteconomia e Ciência da Informação, que o Fórum EBCIB, a exemplo da Associação de Bibliotecários Uruguaios e a exemplo da FESABID espanhola, que o fazem em seus países, poderia chegar à condição de estimular a elaboração e entrega aos candidatos em campanha para a Presidência da República brasileira em 2013-2014, de um documento que representasse a proposta conjunta das entidades atuantes na área de Informação no Brasil. Isso para vir a acontecer requer a construção de convergências num curtíssimo prazo. Não sei se conseguiríamos ao menos ter acordo quanto ao valor desse objetivo!


Para concluir, não creio que os bibliotecários estão em uma zona de conforto, pois isso implicaria ter que assumir como verdade que eles estão a agir intencionalmente nesse sentido negativo. 
 
Penso que há na realidade factual um espaço de tensão no âmbito político da profissão ao qual poder-se-ia chamar de zona de medo, indeterminação e, em certas circunstâncias, uma grande zona de recuo. Isto, quando se interpreta as manifestações de alguns profissionais, pode-se ter a seguinte representação verbal: fui do movimento político profissional, não quero mais sê-lo ou serei somente do meu jeito. Esse não é, certamente, um discurso que remete à zona de conforto e nem é de inconsciência profissional. É, simplesmente, uma ruptura de comunicação!


Muito obrigado.





FONTES



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ALFARO LOPEZ, H. G. Estudios epistemológicos de bibliotecologia. México: UNAM-CUIB, 2010. 133 p.



BAZARIAN, J. O problema da verdade: teoria do conhecimento. 3. ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1988. 221 p.



CARCAMO LANDERO, S. La acción social como proyecto intersubjetivo culturalmente situado. Alpha [online], n.30, 2010, p. 27-40. Disponível em: http://www.scielo.cl/scielo.php?pid=S0718-22012010000100003&script=sci_arttext. Acesso em: 28-2-2013.



DARTIGUES, A. O que é a fenomenologia? 3. ed. São Paulo: Moraes, 1992. 174 p.



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ESTRADA SAAVEDRA, M. La vida y el mundo: distinción conceptual entre mundo de vida y vida cotidiana. Sociológica, v. 15, n. 43, p. 103-151, 2000. Disponível em: http://www.revistasociologica.com.mx/pdf/4306.pdf . Acesso em: 27-02-2013.



HABERMAS, J. Teoria de la acción comunicativa. Madrid: Santillana, 1999. 2 v.



HERNÁNDEZ ROMERO, Y.; GALINDO SOSA, R. V. El concepto de intersubjetividad en Alfred Schutz. Espacios Públicos, v. 10, n. 20, p. 228-240, 2007.

Disponível em: http://redalyc.uaemex.mx/src/inicio/ArtPdfRed.jsp?iCve=67602012 . Acesso em: 13-01-1013.



MORA NAWRATH, H. Mundo de la vida, comprensión y acción intersubjetiva en la

sociología fenomenológica de Alfred Schütz. Cultura, Hombre, Sociedad (CUHSO), v. 18, n. 1, p. 51-68, 2009. Dsponível em: http://repositoriodigital.uct.cl:8080/xmlui/bitstream/handle/123456789/166/CUHSO_0716-1557_03_2009_18_art3.pdf?sequence=1 . Acesso em: 27-02-2013.



MOSCOVICI, S. Representações sociais; investigações em psicologia social. Petrópolis: Vozes, 2003. 404 p.



RETAMOZO, M. Constructivismo: Epistemología y Metodología en las ciencias sociales. Disponível em: http://www.academia.edu/518559/Constructivismo_Epistemologia_y_Metodologia_en_las_ciencias_sociales . Acesso em: 27-02-2013.



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SOUZA, F. C. de. O ensino de biblioteconomia no contexto brasileiro: século XX. Florianópolis, Ed. UFSC, 2009.



SOUZA, F. C. Modernização e biblioteconomia nova no Brasil. Florianópolis: UFSC-CED-Núcleo de Publicações, 2003.


07/03/2013

Por que bibliotecários, arquivistas e museólogos brasileiros precisam pensar pequeno? [Março/2013]




De volta! 2013 está começando com muitas questões.


Uma dessas questões toma a forma de um discurso ambíguo, que a título de defender a otimização dos recursos universitários, visando baratear economicamente a formação de arquivistas, bibliotecários e museólogos, gera um viés que avassala a discussão nessas profissões, dando a entender que o caminho é sua unificação a partir da  sala de aula. De outro, alguns formuladores desse discurso ambíguo tendem a sustentar que a eventual teoria produzida pelas pesquisas em Ciência da Informação serve como suporte para incrementar as inovações necessárias à atuação profissional e às demandas do mercado de trabalho de arquivistas, bibliotecários e museólogos. Isso não está cabalmente demonstrado, na medida em que esses profissionais dependem de muito mais embasamento que aquele dado pela miscelânea temática, teórica e metodológica que constitui a Ciência da Informação.

Um dos argumentos que vez ou outra é apresentado é de que nos anos setenta do século XX a Unesco teria defendido a ideia dessa convergência. Mas não é dito que esse esforço da Unesco não teve o vigor e a aceitação pretendidos. Tratou-se de um discurso construído no ambiente econômico e político que levou à institucionalização da União europeia, à unificação da moeda, à convergência de uma comunidade econômica. Foi, portanto, um discurso que de seu lado contribuiu com todos os demais discursos que deram forma aos defensores da globalização econômica, barateamento do estado, homogeneização cultural, sucateamento das profissões, reestruturação da universidade que, na Europa, passou a ser engessada pelo Tratado de Bolonha, visando apressar e baratear a formação em nível superior.

É essa filosofia do pensar grande econômico que propõe que profissões do universo da cultura pensem pequeno e, se possível, considerem que seus espaços de ação profissional tendem a se tornar caros e, portanto, passíveis de destruição e integração entre si.

Eu não defendo que esse discurso deveria ter validade na Europa e muitos europeus também não o defendem. Houve e há muitas reações negativas a ele. A sua ênfase está presente no esforço dos governos pressionados pelos setores das finanças em assumir como inescapável o minimalismo estatal. Essa peroração circunstancial cada vez mais presente em muitos países da zona do Euro chega ao Brasil e aqui é menos defensável ainda. Se na Europa a cultura escrita, de alcance público em benefício de grande parte da população, tem séculos de existência; se na Europa a Universidade está estabelecida desde o final do século XII, no Brasil a universidade se estabelece no primeiro terço do século XX, com mais de sete séculos de distância e ainda hoje, século XXI, não dispomos de políticas culturais para arquivos, bibliotecas e museus. Nesse caso, como falar, sem corar, um discurso que sugere unificação da formação e da atuação profissional nesses campos?

Apenas para situarmo-nos em nossos déficits de cidadania, enquanto o movimento sindical europeu é forte desde os anos do século XVIII e tem suas raízes em corporações de ofícios do século XII, no Brasil as questões dos trabalhadores urbanos até o início dos anos trinta do século XX eram tratadas pelo Ministério da Agricultura. Isto quer dizer, mais ou menos, que até quase metade do século XX o trabalhador brasileiro era tratado como gado, literalmente. Embora hoje a classe trabalhadora do país tenha avançado em suas condições de cidadania, a defesa de uma ideia no sentido de que profissionais de arquivos, bibliotecas e museus podem ser formados em uma mesma escola, com uma formação unificada, é retroceder no tempo e tratá-los como destituídos de uma percepção de que a história das profissões se faz pela segmentação e não pela unificação. E isso se faz assim, justamente pelo fato de que é na prática profissional que os fatores de complexificação se manifestam e exigem especialização cada vez mais profunda de conhecimento teórico e aplicado.

Nesse sentido, desconsiderando a questionável defesa de barateamento econômico da formação desses profissionais, esse discurso ambíguo (que quer dizer algo, mas teme fazê-lo de cara limpa) deve ser recusado. De outro lado, é relevante observar que ele não é feito e nem defendido pelos profissionais já estabelecidos nesses campos que têm a clara noção das dimensões de suas profissões; que têm uma visão ontológica, teleológica, axiológica e epistemológica de suas práticas históricas e de seus compromissos para o futuro. Esse discurso, em geral, é feito por ilusionistas acadêmicos que, tendo origem em outros campos profissionais, desejam impor a partir do espaço acadêmico visões de mundo que mesmo nos lugares onde essas ideias foram originadas há uma firme recusa em sua aceitação.

Para finalizar, não me parece que a questão se esgota sem uma profunda reflexão e debates honestos em que prós e contras referenciados no contexto social próximo sejam exaustivamente examinados. 

Ciência, religião, política e formação de arquivistas e bibliotecários: lendo Nietzsche com Safranski [Dezembro/2012]

Rudiger Safranski é um leitor de Nietzsche. Como leitor de Nietzsche ele publicou um magnífico livro sobre esse grande pensador do século XIX. Com tradução de Lya Luft e publicado pela Geração Editorial em 2011, está na praça em nova impressão neste ano de 2012. O livro: NIETZSCHE: biografia de uma tragédia, com 363 páginas.

Não contarei nada sobre o livro, do qual recomendo a leitura. Entretanto farei a transcrição de um trecho, para mim relevante, por nele encontrar uma das explicações possíveis para o que está acontecendo com os encontros de estudantes de Biblioteconomia, Arquivologia, etc, no Brasil.

Esses eventos, há décadas, deixaram de ser um espaço de congraçamento e debate político, sendo cada vez mais um ambiente de congraçamento, pois felizmente não se extinguiram os momentos de festas, mas empobrecido ou destituído do debate político. O debate político (quem questiona sua necessidade nos encontros de estudantes?) é cada vez mais fortemente substituído (legitimamente?) pelas seções de apresentação de “trabalhos científicos?”, com direito, estes, a serem objetos de seleção após submissão a processo de avaliação rigorosa.

Não tenho nada contra a que os graduandos tenham espaço para a apresentação do resultado de seus trabalhos de iniciação científica, PET, etc., mas isso não poderia ser feito, por exemplo, no espaço de um ENANCIB JOVEM? Perguntando de outra forma, por que no evento anual da Associação Nacional de Pesquisa em Pós-Graduação em Ciência da Informação e Biblioteconomia (ANCIB), onde são apresentados os resultados de pesquisas realizadas nos Programas de Mestrado e Doutorado (em Ciência da Informação, Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia), bem como a produção de pesquisadores não vinculados a esses Programas, mas filiados à ANCIB, não se poderia oportunizar o encontro de Doutores, Mestres, Mestrandos, Graduados e Graduandos, interessados em pesquisa, uma vez que estariam unidos pelo fino propósito dessa religião da era moderna: a Ciência? Sim, a Ciência.

Em A gaia ciência Nietzsche esclarece, aos seus leitores, porque do seu ponto de vista se precisaria de outra ciência, que não esta que ai está realizada como dever. E que como dever, como religião, tem seus papas, papisas, sacerdotes, iniciações, etc. Não poderia ser a ciência, aliás, os cientistas laicos?

Pois bem, a transcrição de trecho do texto de Safranski, melhor esclarece, em parte, o que isso quer dizer. E, por isso mesmo, creio que nesse espaço religioso de uma das seitas científicas estabelecidas: a Ciência da Informação poderiam estar todos os chefes, os sacerdotes, os crentes e mais os aspirantes ao ingresso nessa seita. Com isso, o espaço mais puro da política poderia ser restaurado, dentre os estudantes de Biblioteconomia, Arquivologia, etc. em seus EREBDs e ENEBDs... Não é algo para pensar?

Eis a fala de Safranski (p.110-111):

Para o pensamento filosófico, no começo da era industrial, as dimensões duradouras do Ser, isto é, Natureza e História, começam pois a transformar-se numa espécie de máquina. A essas “máquinas”, pensam os otimistas entre os contemporâneos de Nietzsche, podemos confiar a produção da vida bem sucedida, sob o pressuposto, todavia, de que nos portemos conforme nossas funções. A transformação do “processo mundial” hegeliano em funcionamento mecânico e dispositivos industriais foi descoberta por Nietzsche, com fina sensibilidade, em seu território mais próximo, a ciência filológica. Formamos os jovens para os levar ao mercado de trabalho científico, lá colocamos cada um diante de um tema e um probleminha pequeno para que ele o trabalhe diligentemente, o todo é uma fábrica científica; não sabemos para que o produto de diligência servem; em todo o caso, eles dão sustento ao seu produtor. Na descrição dessa situação, Nietzsche para em um momento e recorda seu uso linguístico: mas involuntariamente aparecem em nossos lábios as palavras “fábrica, mercado de trabalho, oferta, aproveitamento” – e todos esses auxiliares do egoísmo – quando queremos descrever a mais recente geração de intelectuais.  

Bom, quero reiterar que concordo com a forma como Nietzsche interpretou a modernidade ocidental, sobretudo, estando na Alemanha onde, pela primeira vez na história desta parte do planeta foi contratado em uma universidade um profissional a titulo de cientista. No seu modo de ver, se chegou ao estágio de transformar o pensar e a razão em coisas tratáveis como “objetos” ordenados em linha de produção, partilhando em etapas de diferente complexidade. É isso que está retratado. Isso não se trata de ilusão, é fato. Eu, na atual condição de docente, orientador de TCC, de dissertações e teses reproduzo isso. Sou, portanto, um dos crentes dessa religião; não quero ver-me como sacerdote; sobretudo, sou um dos produtores referidos por Nietzsche e vivo dessa produção. Portanto, não é contra isto que lanço a questão.

A pergunta que faço é: todos os espaços onde acadêmicos se reúnem a qualquer título  devem estar submetidos ao controle do fazer científico? Somos todos, em todos os momentos, somente peças dessa grande máquina, submetidos à estreiteza da produtividade, do produtivismo e, assim, comprometidos com a (de)formação dos espaços políticos, para que os estudantes saiam da graduação desviados da política?

Não creio que possamos, impunemente, deixar de perguntar algo sobre isso, especialmente, nós formadores de bibliotecários, arquivistas....

SALVE 2013!


O bibliotecário brasileiro despreza conscientemente o Código de Ética do CFB? [Novembro/2012]




No início do mês de outubro deste ano estive em uma Escola/Curso de Biblioteconomia em uma das capitais da região Nordeste do Brasil. Nessa oportunidade, proferi uma breve palestra sobre o ensino da ética profissional bibliotecária. O auditório contava com quase duzentos estudantes de bacharelado em Biblioteconomia. A plateia estava constituída por estudantes de todos os semestres, incluída a turma dos recentemente  ingressos. Dá para dizer que uma parte significativa dos presentes já teve a chance de ouvir falar sobre o Código de Ética do Conselho Federal de Biblioteconomia (CFB). Entretanto, nesse Curso não há uma disciplina específica sobre o tema e quando da colação de grau os formandos não prestam o juramento sugerido pelo CFB. Com isso, momentos importantes para a fixação de preceitos de ética profissional e valorização do Código de Ética do bibliotecário deixam de ser propiciados aos egressos dessa instituição. A certa altura da preleção, pedi para os presentes manifestarem-se levantando o braço quando tivessem lido o Código mais de uma vez. Ninguém se mexeu. Depois, pedi para que levantassem o braço aqueles que leram o Código ao menos uma vez. Houve uma única manifestação.

Dias antes de ir a essa instituição eu fiz uma busca no site de sua Biblioteca Universitária. Trata-se de uma universidade pública de médio para grande porte. Ao verificar as informações administrativas dessa Biblioteca, que exerce a coordenação de um sistema de bibliotecas, encontrei menção a sua missão e aos seus valores. Entre os seus valores pude ver que se inclui a Ética. Cliquei o mouse sobre o link “ética” e esse me remeteu ao Código de Ética do Servidor público federal.

Ao confrontar os dois momentos surgiu-me a dúvida ora transformada em título desta coluna:  o bibliotecário brasileiro despreza conscientemente o Código de Ética do CFB?

Por que em uma BU, mesmo existente como parte de uma Universidade Federal, composta como um sistema integrado por várias unidades e onde atuam dezenas de bibliotecários, esses bibliotecários não se posicionam como profissionais bibliotecários antes que como funcionários do Estado? Em que sentido eles veem que se identificar coletivamente através do site da Biblioteca como praticantes da Ética do servidor do Estado é mais valioso do que se identificar pela ética de sua profissão? São essas pessoas, de fato, crentes de que detém uma identidade profissional constituída a partir da academia? Será que essas pessoas veem o valor do que executam profissionalmente com tanta indiferença, que será mais valioso cair na vala comum da aceitação e enunciação de uma identidade profissional tão inexpressiva, quando comparada com aquela que é dada pelo seu diploma e sua carreira profissional? Será que essas pessoas não percebem que antes de serem funcionários estatais, somente ingressaram no serviço público através de um concurso que exigiu o título de bacharel em Biblioteconomia e o registro no Conselho Regional de Biblioteconomia?

De outro lado, será que de fato esses bibliotecários têm a consciência de que sua postura é de completo abandono dos ideais de sua profissão?

Houve um momento neste país, nos anos da década de 1990, em que a regulamentação de algumas carreiras profissionais foi objeto de ameaça. A tentativa governamental caminhava no sentido de desregulamentar as profissões e a de bibliotecário estava entre elas. Conselhos profissionais de várias categorias se mobilizaram e tal evento não se deu. Numa situação desse tipo, é provável que esses bibliotecários, por não se identificarem publicamente como bibliotecários aplaudissem uma intervenção dessa natureza. Entretanto, se isso ocorrer eles seriam meramente servidores públicos como outros quaisquer. Ao afirmar isso não pretendo dizer que os servidores públicos não são bem representados por esse Código de Ética. O que estou tomando para reflexão é o fato de que grande parte das ocupações no Serviço Público é realizada por pessoas cujo ingresso não se deu pelo perfil de uma profissão autônoma e regulamentada. Nesse caso seu Código de Ética é mesmo dado pelo vínculo: servidor público. Porém, no caso de pessoas cujo ingresso no serviço público deu-se pelo perfil de uma profissão autônoma e regulamentada é desarrazoado não se identificar pelo Código de Ética de sua profissão, quando de seu relacionamento com o público.  

Diante da situação exposta, não creio, imediatamente, que o bibliotecário brasileiro despreza conscientemente o Código de Ética do CFB. Credito esse tipo de acontecimento a alguma falha na formação que essa universidade está oferecendo aos seus estudantes de Biblioteconomia. Mas também suponho que há alguma leniência do próprio Conselho Regional de Biblioteconomia, da respectiva região, quanto ao alcance da fiscalização exercida sobre essa Biblioteca Universitária e seus bibliotecários. Em minha leitura a situação descrita vem em prejuízo da imagem profissional do bibliotecário e, por isso, pode afetar a dignidade profissional dessa categoria.